Apesar de eu não querer, ele partiu.
A sua condição física não quis deixa-lo viver mais, muito menos a sua vontade.
Estava cheio de tudo.
Morreu em Novembro há 5 anos.
Há dias ouvia um discurso preparado sobre os dias que passam em que nunca dizemos às pessoas de quem gostamos o quando as amamos, e quando damos conta, é tarde demais para o dizer.
Deixei que ele partisse sem nunca lhe ter dito literalmente que o amava. Queria tê-lo dito. Ainda hoje o digo para mim, no lembrar de todos os dias em que me faz falta.
Era arrogante, másculo, refilão, com maus modos, machista. Mas eu gostava dele assim. A sua mão pesada, e com calos só me dava ternura. E a falta de paciência (que era natural nele) passou-lhe sempre que o meu mimo quis que ele me metesse a comida na boca sentado no seu colo (mesmo sem idade para isso) …
Nunca me gritou, apesar dos desacatos que lhe fazia no quintal, e ainda que o meu pai dissesse para me bater sempre que necessário, nunca o fez (sabendo que o merecia muitas -mesmo muitas - vezes).
Educou-me (e bem).
Se lhe tivesse dito que o amava ele ter-me-ia dito que isso não era coisa de homem, apesar de saber que era verdade, e de saber que ele próprio me adorava (mesmo nunca o admitindo pelas palavras da sua boca).
Tenho saudades de vê-lo que não seja numa foto de jazigo.
Apesar de partir, nunca se foi da minha memória.
Tentei retribuir-lhe nos últimos dias por ter tomado conta de mim durante anos, estando horas a fio ao lado da sua cama, ao lado da sua doença, simplesmente falando, e ajeitando os cobertores. Ele gostava. Mas não o suficiente para voltar a lutar pela vida que a ulcera que queria levar.
Não quis partir sem avisar a minha avó que me desse alguma prenda por esse tempo, em que pensava que me aborrecia ao seu lado. Esse é o meu relógio preferido.
Agora queria ter ido visita-lo mais vezes.
Não era a hora dele, e eu sei bem disso…